Não costumo desacreditar quando alguém diz não “ter tempo”
para certa coisa, porque na verdade é isso mesmo. Nós não temos tempo, ele é
quem nos tem. Mas isso não quer dizer que essa seja uma relação egoísta, absolutista.
Ele nos tem, mas não nos possui, é só que nós, meros mortais, não exercemos
poder algum sobre ele.
Desde que me
entendo por gente, ouço falar que o tempo tem o poder de transformar tudo que
toca, que ele é o melhor remédio para aquilo que parece ser incurável. Mas não,
o tempo não apaga lembranças, não cura a dor de amores mal resolvidos, não
fecha as cicatrizes do coração e nem cura as dores da alma. Ele não tem permissão
de adentrar o interior de cada um e mover as coisas do lugar. Esse, definitivamente,
não é o trabalho dele. O dever dele é transformar o que está do lado de fora.
Assim como a ventania leva as folhas secas do chão para outra direção ou como
as ondas do mar apagam qualquer vestígio na areia,o tempo varre o que está
solto por aí e leva junto dele aquilo que não nos pertence. Ele não faz nada
além de passar. E como já dizia Mario Quintana, “O tempo é um ponto de vista
dos relógios”.
Ás vezes ele vem
como brisa leve que mal conseguimos sentir e outras de vento forte, que
sentimos a quilômetros de distancia e que por muitas vezes tememos, achando que
depois dessa passagem não restará nada. Mas e se quebrássemos todos os relógios?
E se sumíssemos com todos os calendários? E se colocássemos mais um punhado de
areia na Ampulheta? E se... Não meu caro, nada disso adiantaria, ele continuaria a passar.
Sem demora, sem atrasos. Pois então, aproveite os momentos, porque o tempo não
para e a vida não espera por ninguém.
Imagino o tempo
como um senhorzinho calvo, óculos apoiados no nariz, calça com suspensório e
chinelos de dedo, sentando no banco de uma praça deserta, como se estivesse
esperando alguém, esperando alguém que parece não querer chegar.E lhes digo mais, tenho uma leve
suspeita de que o Tempo e a Vida são melhores amigos e que como tal, tem lá os
seus acordos e promessas. Acho até que os dois fizeram um pacto de nunca
partirem um sem o outro, que esperassem a hora de cada um para que possam
seguir a próxima etapa juntos. Como dois irmãos.
Cada pessoa
recebe uma determinada quantidade de areia, determinadas voltas de ponteiro,
nem menos nem mais do que seja necessário para se cumprir o que há de ser
cumprido. Por isso, não importa se o seu tempo passou voando ou se passou em
gotas, o que realmente importa é o que foi feito dele. E quando é chegada a
hora da ultima badalada do relógio, lá está o tempo se levantando bem devagar colocando
o pequeno relógio de ouro dentro do bolso, pondo o chapéu na cabeça, olhando
ansiosamente em direção daquela que vem em passos mansos, de vestido solto, descalça e com lenço amarrado no pescoço, pronta para partir de mãos
dadas com o seu fiel companheiro e a gente nem percebe que agora a Dona Vida e
o Senhor Tempo caminham juntos para um lugar desconhecido, onde os relógios são
apenas quadros decorando as paredes e o “tic tac” é musica para os ouvidos dos
cansados.
-Caliane Melo.