terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O inventor de mim

     
     
      Antes eu era um pedaço de papel amarrotado, molhado, pisoteado, jogado no chão de uma rua qualquer dessa cidade, até que você me encontrou, me colocou no bolso e me levou pra casa. Você me desamaçou, me pôs pra secar, me dobrou diversas vezes e me fez origami, me fez Tsuru. E foi graças a sua astucia e dedicação que por muitas vezes eu me tornei céu, sol, lua, mundo. É isso, você me fez mundo. Daí eu aprendi que se pode ser o que quiser nessa vida se tivermos mãos salvadoras como as suas. De uma forma ou de outra nós sempre seremos usados por outras pessoas. Nem tem como evitar, é uma regra da vida. É impossível se escupir, se emoldurar sozinho, apenas com as suas próprias mãos, aí é ter sorte de cair em boas mãos, literalmente.
      Ainda me lembro da sua ultima invenção de mim. Estávamos sentados numa calçada qualquer, da mesma rua qualquer em que você me encontrou. E então, como aquele seu sorriso de quando uma ideia louca está por vir, você apontou pro céu e perguntou:
- Que acha de ser uma estrela?
- Não acho que isso possa ser possível.
- Mas quem foi que te disse uma mentira dessas? Fazemos um trato então: Eu serei céu e você minha estrela!
- Ah é? E se eu quiser ser uma estrela do mar?
- Ora, então eu serei o seu mar, serei até oceano se preferir.
- E se eu não quiser ser estrela?
- Aah, então eu terei de deixar de existir junto de você.
   E foi assim, com conversas de doido e ideias absurdas que eu me tornei estrela, sereia, chuva. Foi assim que eu me tornei tua.

- Caliane Melo.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

" Pois agora lá fora, o mundo todo é uma ilha "

     Mas essa vida é uma caixinha de surpresas mesmo, hein! Quando criança, eu contava os dias para me tornar “gente grande” e ter liberdade e agora cá estou eu tentando de tudo, fonte dos desejos, gênio da lampada, porções magicas e até uma audiência com o Sr. Tempo, só para poder voltar aquele mundo onde a verdadeira liberdade residia. Agora as coisas, as pessoas e o mundo são tão diferentes. Ou talvez a única coisa que tenha mudado nessa historia foi eu.
     Quando a gente é criança, a felicidade parece ser tão nossa amiga, parece que ela vem junto com os chicletes em forma de tatuagem e quando ela se apaga é só comprar outro que fica tudo bem. Parece que o nosso mundo é sempre colorido, todo pintado com tinta a prova d’agua. Parece que todos os dias são ensolarado e tudo tem cheiro e sabor de Tutti Frutti – quer dizer, nem tudo, os remédios são amargos em qualquer mundo -. Mas agora, no degrau onde eu estou, a felicidade não passa de uma lenda, o mundo é todo em preto e branco e quando chove tudo fica borrado, os dias são sempre nublados e as pessoas andam sempre em linha reta, como robôs programados a seguir em frente sem desviar do caminho e sem direito a fazer perguntas.
     Crescer foi mais difícil que eu pensava. Mas por que será que dói tanto fazer essa transição de mundos? Acho que quando nós deixamos de ser crianças, perdemos todos os nossos super poderes, nossa varinha de condão e a nossa imaginação é reduzida a menos que a metade. Na verdade, eu acho que desde que nascemos até o dia em que passamos para a próxima fase da vida, as penas de nossas asas são arrancadas uma a uma, nos deixando incapazes de voar e com o passar dos anos os músculos dessas asas se atrofiam. Por isso dói, por isso que vai doer para sempre.
     Hoje eu me encontro tentando desviar desse caminho, que ninguém sabe aonde vai dar, recolhendo do chão pena por pena das minhas asas. Mas o que acontece depois de reunir todas elas? Eu não faço a minima ideia, mas vou continuar procurando e guardando-as nos bolsos, até o dia em que eu descubra como devolver a vida ás minhas asas, e voar rumo á felicidade perdida.

- Caliane Melo.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

" Tivesse medo? O medo da confusão das coisas, no mover desses futuros, que tudo é desordem. E, enquanto houver no mundo um vivente medroso, um menino tremor, todos perigam - o contagioso. Mas ninguém tem a licença de fazer medo nos outros, ninguém tenha. O maior direito que é meu - o que quero e sobrequero - : é que ninguém tem o direito de fazer medo em mim. "

( Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas)